Finalmente ancorou
e o coração serena  — não a voz
que segue
à espera da grande onda
         que faz voar as âncoras.
Pequena voz
que clama no deserto
parábolas antigas.

E o ruído do vento
E o vento  o vento
Onde a beleza se esconde
senão nos olhos
aquários antigos
almas seculares
(velha voz)
ambíguos
ante_passados
sentimentos
(dia a_pós)
mas o que há de moderno
em nós?
A moça 
quer ter a voz do rio e a cor dos seus cabelos
então mergulha. sem saber
que o rio é espelho.
Inaugura cantatas em tons de espanto
enquanto as águas
tingem as crinas de vermelho.
Sufoca gemidos. ruídos 
que se arrastam no fundo da garganta
[ de limo e pedra. 
Mechas são detritos
de gente e árvore. de bicho e lata.
Restos
[ de vida e pedra.
A moça vira peixe
cabelos verdes de medusa.marinha. Que todo rio
é mar. sem saber.
E canta
abismos insondáveis. 
A velha voz.aguda e ríspida.insiste
em abafar doçuras.
Fosse ainda o silêncio
mas não.
A voz de dentro
não cala.
Às vezes muda.de tom.
Graves oblíquas óbvias:— palavras. 
Ouço vozes. muitas — não as distingo.
[repetem palavras repetem]
E tudo
que precisava ouvir
era o som
de um pedregulho
atirado no lago.
[e que os círculos concêntricos 
nos redimam e o silêncio nos liberte]
São tantas vozes. tantas
que a melodia se confunde
num ruído dissonante

de percussiva beleza
e raro encanto.
Todas as vozes que um dia julguei
vindas do céu
vinham de dentro
de mim.
Julgo então não haver céu — ou
eu o contenho. 
Nenhuma
Articulada fala
arte língua pátria. mãe
te quero minha.

Me sinto. no exílio
quando te calas.
A voz
a voz que soprava poemas
agora se cala.
A voz
foi soprar noutros cantos
cantos outros. 
Dissonante voz miúda
neste tempo agudo de ruído 
e ventania
pétala que não se ouve
quando se toca 
o chão.
E quem quer saber de flores 
neste tempo obtuso
de pedra?
Diz com o olhos
o que não ousa dizer
a voz.

Resta saber
— haverá espelhos?
A voz
quando se cala
tem a severidade  de mil casulos.
Só o tempo
pode romper o claustro
e libertar as asas
da voz.      
    
Procuro minha voz procuro / eco / é tudo que encontro
desfeito no caos
vindo de dentro das cavernas de mim.
Reverberados medos / cadeias de montanhas
tempo floresta / intransponível
[ alguns pássaros
vitórias régias rios rastros de bichos barro [ berros
que tudo grita porque tudo vive e dói
essa aventura rouca
de viver  em busca do verbo grafado
na pedra da garganta.
[ a ponte movediça sobre o pântano negro
onde toda palavra se debate e naufraga 
olhos de crocodilos / invertidos espelhos
confusão dos sentidos
mil sons / então: submerge o poema [ silenciosamente.
A voz antiga me ronda, quer voltar.
Mas já não sabe cantar essa voz, então se arrasta
lenta, pesada, triste.
Carrega memórias e esquecimentos
lamúrias e dores
e gritos ancestrais.
E diz de campos de flores e trigo
que já secaram.
Embarques, chegadas, partidas
em trens e navios agora fantasmas.
De mares e rios que transbordaram.
Estradas e trilhos cobertos
de árvores de cipós.
O pó dos dias embaçou os olhos e a voz se perdeu
entre ruído e música que insistem
em perturbar o tom
e o ritmo original.
Dissonante poema, que oscila entre o que não foi
e o que se perdeu no caminho.  
A voz que cantava miudezas 
quer voltar. 
Mas os olhos estão cegos
de tanto olhar lonjuras 

[infecundas e prescindíveis]
Decidi baixar o tom. da voz.
Estridente demais
talvez seja ela
que me faça doer
a cabeça.
(e como dói)
Poética voz — descansa.
Fala baixo ou
cala a boca.


Poética voz — descansa
que a outra
já não sabe da cor
do tom. do tato
do verbo. a desmanchar
colado. no palato.   
Perdeu a voz - nenhum som
gemido canto sopro
palavra — está muda.
Talvez não tenha mesmo 
mais nada a dizer.

Você me tiraria pra dançar?
Pergunto.
Mas não há música
você diria
nenhuma voz.
Na memória dos pés
uma canção
antiga.
Na memória dos sentidos
ninguém.
Como compor a sua música
se está só?

Sem a voz (o respiro)

que faz nascer a nota
e a letra

das canções.